Fragilidades Estruturais e Convergência de Expectativas

Apesar da sequência de recuperação nos mercados de ações ao longo das últimas semanas de abril, alguns elementos estruturais seguem emitindo sinais preocupantes — e que, embora tenham escapado do foco imediato da mídia, merecem atenção redobrada dos investidores.

O primeiro deles é a precária composição da atividade econômica nos Estados Unidos. Como destacado em relatórios recentes, boa parte da resiliência nos dados agregados tem vindo de três pilares temporários: o crescimento de gastos públicos, o consumo de serviços (principalmente com poupança excedente acumulada) e os investimentos corporativos em infraestrutura para inteligência artificial. Todos os três, no entanto, começaram a desacelerar em abril. Sem esses suportes, fica evidente que vastos setores da economia privada — como habitação, manufatura, transportes e consumo de bens duráveis — já estão em recessão há pelo menos dois anos, algo que temos mapeado no nosso framework macro continuamente.

Morgan Stanley Business Conditions Index: deterioração no ambiente de negócios segue volátil e volta para padrões negativos em abril.

A segunda fragilidade é o ponto técnico relacionado às revisões de lucros esperados. Embora o consenso já tenha drasticamente reduzido o crescimento de 15% para apenas 6% no lucro por ação (EPS) do S&P500 em 2025 (chegando a US$ 257 por ação), já existem casas de pesquisa com projeções alternativas apontando para valores inferiores. E esse detalhe importa: a faixa de valuation entre 18x e 20x que o mercado tem praticado no índice de preço do S&P500 dividido por lucro futuro se torna excessivamente apertada se os lucros decepcionarem mesmo que marginalmente. A volatilidade que vimos não deve ser lida apenas como reação às tarifas, mas como sinal de um mercado tentando reprecificar risco de decepção de crescimento de lucros em tempo real.

Fechamento de Abril, novamente a queda de lucro por ação trimestral do S&P é parcialmente recompensada com aumentos para o ano que vem, escondendo a continuidade de fragilidades.

O PIB do primeiro trimestre surpreendeu negativamente, com uma variação de -0,3%, contrariando a percepção de resiliência da economia americana, não por causa do resultado em si, mas devido à queda no ritmo de crescimento do consumo doméstico, voltando a níveis do início de 2023. A principal explicação técnica para o valor negativo foi o salto de 41% nas importações, provavelmente puxado por antecipações ligadas à guerra comercial. Esse efeito distorceu o cálculo do PIB, já que importações são subtraídas da atividade doméstica. Ao mesmo tempo, cortes de gastos do governo ajudaram a diminuir o crescimento do PIB. Consideramos que o dado de consumo acende o alerta para uma desaceleração mais ampla caso continue nesta tendência.

O risco de recessão permanece material, ainda que difuso nos dados de curto prazo. A estimativa média de probabilidade do consenso da indústria aumentou materialmente, próxima de 40%. A diferença agora está no tempo e na forma: trata-se menos de um colapso abrupto e mais de uma deterioração gradual, e diferente de outras ocasiões, o Fed não aparenta estar tentando antecipar este risco até que o desemprego possivelmente aumente. É uma recessão que se desenha “por exclusão”: o crescimento não desapareceu, mas está cada vez mais restrito a nichos específicos da economia. O risco real não é uma quebra súbita, mas um esgotamento progressivo da tração macro, difícil de identificar em tempo real, mas altamente corrosivo para projeções de lucros, crédito e emprego.

Por fim, existe um elemento estrutural e ainda pouco precificado: o risco de estagflação. A combinação entre juros mais altos, necessidade rolagem de dívida a taxas superiores, somada à fragilidade da confiança do consumidor causada majoritariamente por tarifas, tudo isso pode colocar pressão sobre o crédito e deteriorar os balanços empresariais por múltiplas vias: custo de rolagem, aperto no consumo e perda de margem. A consequência é que, mesmo sem uma “recessão formal”, o ambiente macro pode ser restritivo por tempo suficiente para comprometer as expectativas de lucros futuros.

Fim de Abril, relatórios trimestrais de empresas americanas começam a dar indícios de quedas nas margens operacionais, principalmente nas grandes empresas que têm carregado a bolsa. Dados Morgan Stanley.

A erosão silenciosa da qualidade dos fundamentos, encoberta por eventos episódicos e intervenções políticas, talvez, seja o verdadeiro risco do segundo semestre de 2025.

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